Nilton Santos: A luta pela vida

 Simplesmente de arrepiar a reportagem publicada em duas páginas da edição de hoje do Correio Braziliense sobre o duelo de Nilton Santos contra o mais implacável marcador que já enfrentou na vida: o Mal de Alzheimer. 

Impressiona o fato de, quando surge a lucidez, Nilton demonstra que continua amando o Botafogo com todas as forças que lhe restam aos 82 anos.

Eis alguns trechos da reportagem “O outono de um craque”, do excelente repórter Ricardo Miranda.

“Quem o vê reconhece imediatamente os olhos miúdos, o sorriso talhado no rosto, a voz rouca e baixa modulada agora num fiapo de som, o rosto marcante do outono de um dos maiores jogadores brasileiros de todos os tempos, sucedido fora dos gramados por uma analista lúcido e grande contador de causos do futebol. Desfeita a miragem inicial, percebe-se que se está diante de um homem lutando bravamente por cada naco de vida, por cada segundo de lucidez. No quarto número 21 da bucólica clínica de paredes amarelas, que há um ano virou o lar de um dos grandes laterais-esquerdos da história do futebol, a Enciclopédia do Futebol, campeão mundial pela Seleção Brasileira em 1958 e 1962, o homem cujo lugar cativo já está reservado na história do futebol brasileiro trava diariamente seu duelo particular pela sobrevivência. E no próximo dia 16 de maio, as janelas do apartamento de 50 metros quadrados no terceiro andar da ala geriátrica da Clínica da Gávea, na zona Sul do Rio, vão amanhecer abertas para trazer para dentro o aroma dos eucaliptos e a brisa fresca que sopra sem parar no alto da Estada da Gávea. O ilustre paciente fará 83 anos.

 

LUCIDEZ E ESCURIDÃO

Nilton Santos vive hoje o crepúsculo de um grande ídolo. Segundo Maria Célia, sua companheira há 37 anos, que preserva a todo custo a imagem de seu grande amor, Nilton sofre de demência senil, uma deterioração neurológica progressiva e irremediável, que faz com que alterne momentos de lucidez com períodos na escuridão. Fala com dificuldades e não reconhece pessoas. Nilton também sofreu recentemente outro revés, uma dengue hemorrágica, da qual só se recuperou, segundo Célia, por um milagre. “As plaquetas dele chegaram a 50 (mil mm3). Mais um pouco e ele teria que ser transferido daqui”, conta ela. Agora, recupera-se de uma pneumonia. 
Deitado na cama, o olhar indecifrável, o corpo quase imóvel, muito mais magro (em parte por causa de dengue), Nilton dá a impressão para quem o conheceu antes que saltará de repente da cama e nos surpreenderá com sua gargalhada contida, exibindo os dentes da frente separados, divertindo-se com sua própria condição. Mas, infelizmente, não há brincadeira. Nem volta.

 

APOIO DO BOTAFOGO

O estado do ídolo mobiliza toda a direção do Botafogo, a começar do presidente Bebeto de Freitas, que deu ordem para que não sejam medidos esforços para garantir o conforto e a tranquilidade do maior patrimônio vivo do clube. O Botafogo paga todas as despesas de Nilton na clínica e colocou seu médico e cardiologista, Paulo Samuel, permanentemente na cabeceira do ex-jogador, a ponto de ser chamado pela família de “anjo da guarda”.

Nilton e Célia vivem de poucas rendas, especialmente da modesta aposentadoria de Nilton da LBA (Legião Brasileira de Assistência). “A sensação que sinto ao vê-lo assim é de tristeza, muita tristeza. Mas me conforta ver o Nilton cuidado da melhor forma possível. E isso graças ao Botafogo, especialmente ao Bebeto de Freitas, que teve a sensibilidade de permitir uma velhice melhor a um ídolo. Sem o Botafogo, não estaríamos aqui. Nem remédio para ele poderíamos comprar”, diz Célia.

SANTUÁRIO ALVINEGRO

Quarenta e quatro anos depois de sua última partida como jogador profissional, seu grande alimento continua sendo o Botafogo. A simples menção do nome faz com que sua fisionomia mude. Não por acaso o quarto que hoje é seu lar foi ‘decorado’ por Maria Célia para aconchegá-lo, cercado por medalhas, taças, fotos de todas as épocas e quadros pintados por ele a partir de 1990. A camisa 5 de Túlio, entregue pelo próprio volante, está guardada no pequeno armário. Uma mesa guarda um mosaico com as feições do então jovem jogador. Um sofá, próximo à cama, foi coberto com a bandeira do Botafogo. Almofadas, relógios, imãs de geladeira, tudo lembra o time da estrela solitária.

SORRISO NA DESPEDIDA

Quando consegue, Nilton assiste aos jogos do Botafogo. Assistiu parte da semifinal da Taça Guanabara contra o fluminense e, no intervalo, chutou e acertou o placar. “Só me chamem quando estiver 3 x 0″, avisou. O primeiro jogo da decisão contra o flamengo não viu e, aparentemente, ignora o placar. Nunca se sabe quando irá submergir e emergir de volta. Nilton se despede com um sorriso terno. Célia controla o choro. Pairam pelo quarto lembranças de outros ídolos do passado, do presente, de sempre, que sofreram de processos degenerativos semelhantes, como Leônidas da Silva, o Diamante Negro, e o húngaro Ferenc Puskas. Como eles, Nilton jamais terá que se preocupar com a memória. Para nós, ele nunca será esquecido. Nem hoje. Nem nunca.”

Assinantes podem ler a matéria, na íntegra, e ver as fotografias do quarto-santuário de Nilton no site do jornal (www.correiobraziliense.com.br).

Eis, senhores, o maior jogador-torcedor alvinegro de todos os tempos.

Por isso, defendo a idéia da mudança do nome oficial do Engenhão para Estádio Olímpico Nilton Santos.

Mais do que qualquer cartola, ele merece.

 

 

Uma resposta para “Nilton Santos: A luta pela vida

  1. Marcelo, esperemos quer o Nilton arrume um tempinho de lucidez para fruir a vitória do Botafogo!!!

    WELLINGOL NELES!
    SAUDAÇÕES BOTAFOGUENSES

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